quinta-feira, 18 de junho de 2009

Melhor ser comparado a cozinheiro do que a magistrado

“Melhor ser comparado a cozinheiro do que a magistrado.” Ouvi essa frase hoje na faculdade e ela refletia exatamente o que senti.

Será que o destino de nosso país está em mãos seguras? Esses magistrados tomam decisões que afetam diretamente nossas vidas. Mas... eles têm competência para tal e merecem todo esse poder?

Mas vamos, então, às declarações (na minha opinião, pérolas) emitidas pelos prezados ministros:

“Não se pode fechar as portas dessa atividade comunicacional, que em parte é literatura, arte, muito mais do que ciência, muito mais do que técnica. Não se pode fechar a atividade jornalística para expoentes”, defendeu Carlos Ayres Britto, ministro do STF.

Ministro, com todo o respeito, o senhor devia se informar melhor sobre a profissão antes de votar. Aprendemos, desde o 1º semestre na faculdade, a separar jornalismo e literatura. Uma coisa é criar histórias, outra coisa é relatá-la, buscando sempre respeitar os princípios de isenção, imparcialidade, etc. Não se pode mesmo fechar a atividade jornalística para expoentes. Eles têm mais é de estudar, pois sempre pode se aprender mais do que se sabe. E se aperfeiçoando, conhecendo as técnicas e princípios éticos que os cursos de jornalismo oferecem, poderão oferecer muito mais à sociedade.

“O curso de jornalismo, portanto, não garante eliminação das distorções e dos danos recorrentes do mau exercício da profissão, que são atribuídos a deficiências de caráter, de retidão e ética”, afirmou Cezar Peluso, ministro do STF.

Ministro, mesmo sendo submetidos a todo esse preparo e conscientização, muitos jornalistas cometem erros, não é? Imaginemos sem isso então?! O curso de jornalismo realmente não garante eliminação das distorções e dos danos recorrentes do mau exercício da profissão, mas com certeza nos faz refletir bastante sobre a responsabilidade que temos para com a sociedade e para com a informação verdadeira. Na faculdade, discutimos questões que dificilmente pensaríamos sozinhos. O senhor não acha que a falta de regulamentação da profissão e o despreparo podem abalar o senso de responsabilidade e piorar a situação?

"A comunicação de idéias, do pensamento, hão de ser livres, permanentemente livre, essencialmente livres, sempre livres", afirmou o Ministro do STF, Celso de Mello.

Sim, ministro. E é por essa liberdade que o jornalismo luta, o senhor não sabia? Lutamos para ouvir toda a sociedade. E, realmente, todos temos o direito de dizer o que pensamos, de argumentar, questionar, emitir nossa opinião pessoal. Mas o jornalismo não é o lugar para isso. Para esses casos, temos a internet, os blogs, cartazes, faixas e espaços cada vez mais participativos nos veículos de comunicação. Mas tratar com a notícia e com a informação é diferente, ministro. O jornalista abre mão de sua opinião pessoal para transmitir a versão de todos os lados envolvidos na notícia. Aliás, esse é um dos principais princípios jornalísticos: buscar o máximo de imparcialidade. Emitir opinião pessoal, só quando ocupamos a posição de analista ou comentarista. Mas para isso já não se é exigido o diploma específico de jornalismo. Deveriam ter ensinado melhor sobre a profissão para os senhores antes da votação, pois o senhor acha que estará lutando pela liberdade de comunicação de ideias transformando todos em jornalistas, mas o jornalista abre mão desse direito de opinar ao exercer a profissão. Como ficamos? Ham?

Aliás, diante disso, nem preciso comentar que cai por terra o principal argumento do Supremo, neh? O de que a exigência do diploma contraria os direito de livre expressão.

Para se expressar, existem vários meios. Internet, blogs e até mesmo nos próprios jornais. Existem espaços destinados a esse fim, como colunas e artigos. Acontece que notícia não é lugar de se expressar, mas de relatar. Resumindo: Percebo uma grande confusão quanto ao que seria liberdade de expressão e o que seria jornalismo.

Mas, voltando às declarações, vamos às do presidente do Supremo, ministro Gilmar Mendes:

"Quando uma noticia não é verídica ela não será evitada pela exigência de que os jornalistas frequentem um curso de formação. É diferente de um motorista que coloca em risco a coletividade. A profissão de jornalista não oferece perigo de dano à coletividade tais como medicina, engenharia, advocacia nesse sentido por não implicar tais riscos não poderia exigir um diploma para exercer a profissão. Não há razão para se acreditar que a exigência do diploma seja a forma mais adequada para evitar o exercício abusivo da profissão", disse.

Como o senhor diz isso, ministro? Educação e especialização não têm valor algum para o senhor? E na opinião do senhor o jornalismo não traz perigo de dano à coletividade? O senhor já imaginou os danos causados por uma mentira disseminada ou uma verdade ocultada na sociedade? Eh... o jornalista lida com isso. Aliás, ele é o responsável por vigiar os poderes, fazer denúncias de exploração, corrupção, etc, investigar e apurar a verdade ou histórias mal contadas, e, por seu poder de alcance e repercussão, pode afetar diretamente a vida de uma pessoa, comprometendo sua honra. O senhor acha que ter a honra comprometida é pouca coisa? Jornalistas precisam ser responsabilizados por suas ações, pois elas afetam, sim, o indivíduo e a sociedade. Para esse tipo de situação são preparados durante a faculdade.

Para finalizar, Mendes chegou a comparar a profissão de jornalista com a de cozinheiro. "Um excelente chefe de cozinha poderá ser formado numa faculdade de culinária, o que não legitima estarmos a exigir que toda e qualquer refeição seja feita por profissional registrado mediante diploma de curso superior nessa área. O Poder Público não pode restringir, dessa forma, a liberdade profissional no âmbito da culinária. Disso ninguém tem dúvida, o que não afasta a possibilidade do exercício abusivo e antiético dessa profissão, com riscos eventualmente até à saúde e à vida dos consumidores", disse.

Acho a profissão de chefe de cozinha e de um cozinheiro muito importantes, mas não entendo a relação que elas têm com o jornalismo em si. Talvez o Supremo Tribunal Federal, na figura de seu presidente, tenha dito, por meio de uma metáfora, que os brasileiros têm mais é de se contentarem em comer arroz empapado e feijão duro. Se o jornalismo passar disso, incomoda.




Acesse também...

Site do STF
Pronunciamento da FENAJ
Notícias: ABI repudia decisão do STF

Mobilização/iniciativa pós-votação:
http://oglobo.globo.com/pais/mat/2009/06/18/helio-costa-defende-pl-para-tornar-obrigatorio-diploma-de-jornalista-756398867.asp-obrigatorio-diploma-de-jornalista-756398867.asp
http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u582910.shtml

Um comentário:

Joelmir Tavares disse...

Sabrina, assino embaixo de tudo que você escreveu. Sensacional.
Ótima tirada esta sua: "[...] Os brasileiros têm mais é de se contentarem em comer arroz empapado e feijão duro. Se o jornalismo passar disso, incomoda."
Minha esperança é de que o mercado possa se regular. Do contrário, só teremos a perder - nós e a sociedade.